Evangélicos sob inquisição
Aumenta na sociedade e na mídia o patrulhamento à expressão de fé cristã e bíblica.
Os jornais, telejornais e sites informativos tiveram um assunto dominante nos primeiros dias de maio. A prisão do pastor Marcos Pereira da Silva, líder da Assembleia de Deus dos Últimos Dias, foi um daqueles assuntos obrigatórios, repetidos à exaustão pela mídia. Controvertido por sua proximidade com criminosos e presidiários, Marcos foi preso sob acusação de haver estuprado algumas de suas fiéis e por desvio de recursos de seu ministério, que contava até com verba pública. Foi o suficiente para que o pastor fosse capa de jornal por vários dias seguidos e ocupasse blocos e mais blocos dos noticiários da TV. Claro, o fato em si é jornalístico e de interesse público, daí a quantidade de citações. Ainda que a culpa de Marcos não tivesse sido provada em Juízo, ele foi preso, como determina a lei, já que havia diversas acusações e o temor de que, solto, pudesse fugir ou prejudicar as investigações. Mas a superexposição do fato leva a uma dúvida: não fosse o suposto criminoso um pastor, o episódio teria tanto destaque?
Recentemente, outro fato nacionalmente comentado e noticiado envolveu um ministro evangélico. A chegada do pastor e deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal foi um daqueles cases dignos de estudo nas faculdades de jornalismo. Independentemente dos predicados pessoais de Feliciano – e, convenhamos, ele deu boa munição aos seus detratores de plantão, com um bocado de declarações e mensagens infelizes –, chamou a atenção a fúria com que a imprensa se abateu sobre ele. "Despreparado", "racista", "homofóbico", "primitivo" e "reacionário" foram apenas alguns dos adjetivos atribuídos ao parlamentar. A parcialidade de setores da grande imprensa chegou a assustar. Feliciano aparecia nas reportagens como alguém indigno do cargo que recebeu legitimamente dos seus pares, um sujeito que jamais deveria ter pisado no plenário do Congresso (para onde foi conduzido, é bom dizer, por mais de 200 mil eleitores).
A jornalista Suzana Singer, que exerce o papel de ombudsman da Folha de São Paulo, registrou o fato. Mencionando a falta do "outro lado" – no jargão jornalístico, a prática saudável de ouvir as duas partes na maior igualdade de condições possível –, ela escreveu: "É pouco perto das dezenas de textos negativos (reportagens, colunas e editorial) publicados desde que o caso estourou. A impressão que se tem, lendo jornais, revistas e navegando na internet, é que há unanimidade contra o deputado do PSC. Falta dar espaço às vozes dissonantes daqueles que criticam a cobertura da mídia e se recusam a entrar na corrente 'anti-Feliciano'."
LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA
Uma das características marcantes dessa pós-modernidade é a liberdade de consciência e de expressão. Tais prerrogativas estão ligadas à autonomia do indivíduo, um dos valores fundamentais em democracias. Se, no passado, a opinião de alguém era fruto de reflexão e dependência do ambiente em que vivia – como, por exemplo, da família ou da sociedade –, hoje, o indivíduo pode tomar decisões por conta própria, sem consultar ninguém. Cada um é dono de sua vida. Dizemos, assim, que o mundo tem ficado plano. Isto é, todos são iguais e ninguém é maior do que ninguém. Cada pessoa tem o direito de pensar o que bem entende, e expressar isso publicamente. O público se tornou privado, e o privado tem o direito de se tornar público. Direito é uma palavra de ordem do dicionário contemporâneo. Temos códigos de direitos para quase tudo na vida – direito do consumidor, direito da criança e do adolescente, direito do idoso etc. Pena que ainda não pensaram em fazer a contraparte, ou seja, a elaboração de códigos das responsabilidades de cada um.
Se tal realidade é uma das características principais da pós-modernidade, é bem verdade, também, que esta é uma era dos paradoxos. Se há liberdade por um lado, tem havido, também, repressão e intolerância quanto à manifestação de opiniões nem sempre coincidentes com a opinião geral, ou senso comum, como se queira. Neste território, podemos pensar na campanha generalizada da mídia e de segmentos da sociedade que também têm forte apelo e acesso aos meios de comunicação de massa, incluindo-se a internet, contra quase qualquer opinião que seja originária do meio religioso, especialmente do segmento evangélico.
Um exemplo clássico bem recente é a agressividade e preconceito expressos recentemente contra especialistas evangélicos (e, de fato, existem poucos) que têm manifestado sua opinião contrária, por exemplo, a duas bandeiras que têm sido levantadas, e bem alto, por grupos de interesse mais ou menos organizados: a flexibilização das leis que permitem o abortamento e a valorização da identidade homoafetiva de gênero. Aliás, o famoso projeto de lei 122/06, conhecido como lei anti-homofobia, em seu texto original, já representa afronta à liberdade de expressão e consciência, tão claramente insculpidas na Constituição Federal. O PL 122/06 já demonstrou ser uma verdadeira mordaça totalitária contra o direito de qualquer pessoa manifestar a sua opinião contrária ao comportamento gay. A ex-senadora e hoje ministra Marta Suplicy propôs uma aditiva ao texto em discussão, abrindo-se a possibilidade de manifestação em virtude de fé e crença – mas, e quanto a quem queira expressar sua divergência contra a homoafetividade por simples motivo de opinião pessoal?
É curioso esse tempo em que vivemos, quando todos têm direito de dizer o que pensam, mas não se vê com bons olhos aqueles que se manifestam contra este ou aquele posicionamento ou grupo. Se o discordante for evangélico, então, o patrulhamento é mais intenso. Em outras palavras, preconceituosamente, os evangélicos são rotulados como preconceituosos. É um paradoxo completo, um totalitarismo sem fim.
"HEROÍNA GAY"
Atitudes como essas, que tomam a agenda de segmentos da sociedade e dos meios massivos de comunicação, se assemelham ao triste passado desse país, quando a discordância era tratada como crime. Já não é possível, em alguns círculos, que qualquer religioso – notadamente, evangélico –, movido por razões de crença e consciência, emita sua opinião livremente sem receber a pecha de preconceituoso. A discriminação embutida nessa "cruzada" contra a divergência é notória. Artigo de Leandro Colling publicado em 2011 na mesma Folha de São Paulo, intitulado Desnaturalização da heterossexualidade, procura defender a tese da coação cultural da heterossexualidade como se esse comportamento fosse resultado de uma imposição cultural. A argumentação deixa, por exemplo, de levar em conta os aspectos científicos elementares da constituição neurobiogenética e a funcionalidade diferencial que se tornam fatores fundantes e identitários da pessoa.
Ora, o homem tem uma constituição genética e neurológica diferente da mulher, e vice-versa. Então, a identidade de gênero como tem sido defendida acaba reduzida a um recurso artificial, utilizado para se tentar legitimar, pela dinâmica ou evolução cultural, a contradição entre identidade de gênero e sexo neurobiogenético. Enfim, o articulista tenta convencer que o heterossexual é um sujeito inferior, que não teve a oportunidade de optar por ser assim, mas foi submetido a uma imposição cultural irresistível. Eu perguntaria: E se amanhã a pedofilia for aceita culturalmente como uma espécie de "evolução cultural", teremos de aceitar esse crime como comportamento legítimo? Colling tem o direito de emitir a sua opinião, mas não de adjetivar os heterossexuais como seres inferiores, como intencionou no artigo. Ao mesmo tempo, a chamada grande imprensa faz questão de adjetivar positivamente os gays. Há coisa de dois meses, a cantora Daniela Mercury resolveu tornar pública sua relação homossexual com uma jornalista. Coincidência ou não, a notícia, transmitida em horário nobre pelos principais telejornais e publicada na capa dos jornais e de duas das maiores revistas semanais de informação, saiu no auge da "crise Feliciano". Contudo, os adjetivos dirigidos à artista foram bem diferentes: "Corajosa", "digna", "exemplo a ser seguido"... De uma hora para outra, Daniela, por sua homossexualidade, foi alçada à condição de heroína nacional.
Podemos achar horrível o que Marcos Pereira fez – se é que fez –, mas é no mínimo desonesto potencializar a acusação em face de sua função religiosa. Podemos, igualmente, discordar completamente de Marco Feliciano e até desejar sua saída da tal comissão que preside. Contudo, não tenho visto nos noticiários qualquer alusão á fé pessoal do senador Renan Calheiros, que assumiu a Presidência do Senado envolto em um mar de denúncias, e nem à religião dos deputados José Genoíno e João Paulo Cunha, que apesar de condenados pela Justiça no caso do mensalão, assumiram cargos na Comissão de Constituição e Justiça com base em brechas legais. A imprensa não cita a profissão de nenhuma personalidade sob suspeita. Fosse Feliciano um padre e Pereira, um pai de santo, como seriam tratados?
Há evangélicos e pastores que cometem crimes ou se metem em atos de corrupção? Sem dúvida, da mesma maneira que há padres pedófilos, bispos desonestos e parlamentares corruptos. Entretanto, a culpa de um indivíduo não pode ser atribuída, pro extensão, ao segmento que integra. Além disso, diferentemente da Igreja Católica, que tem um papa, as denominações evangélicas são descentralizadas, não seguem um líder único. Portanto, ao se fazer esta mistura conceitual do que é ser evangélico, ignora-se a imensa maioria de crentes honestos e corretos.
E a mídia tem grande participação nesse processo de convencimento social, na medida em que faz germinar o estereótipo do evangélico como alguém extremado, esquizofrênico, mentalmente desajustado. Vivemos hoje um tipo de inquisição que tem como objetivo relegar o título "evangélico" a um sinônimo de obsolescência, de gente retrógada. Isso é notório quando se percebe, com as exceções de praxe, coberturas completamente equivocadas sobre o segmento, que indicam desconhecimento da dinâmica e da história da Igreja Evangélica brasileira e de seu povo – sem contar a omissão deliberada de fatos concretos que demonstram a seriedade das denominações protestantes e sua magnífica contribuição que já prestaram e ainda prestam nas áreas social, educacional e de saúde, entre muitas outras. Raríssimas vezes, tal legado é exibido, a não ser como nota de rodapé em uma página de jornal ou programa de TV. Isso, sem se falar nos personagens caricatos, ridículos mesmo, que representam os evangélicos nas telenovelas.
QUEM É SEITA?
O que é possível concluir é que está havendo uma campanha, muitas vezes imperceptível ao olhar menos atento, para prejudicar a imagem do evangélico e do protestante, ao estilo de uma refinada estratégia terrorista. Aliás, uma das estratégias terroristas para sabotar qualquer agrupamento segue três passos bem definidos – infiltrar, corromper e, depois, desmoralizar. O que temos hoje não é direito, mas delito de opinião, ao não se respeitar conceitos diferentes. O protestantismo histórico, desde a sua origem – basta ver o conceito de sacerdócio universal –, defendeu o liberalismo, o indivíduo. Não somos intolerantes; intolerantes são os que nos criticam por termos opiniões definidas.
Aliás, é necessário diferenciar preconceito de conceito ou convicção. Todos têm o direito a ter sua opinião (conceito, convicção) e ninguém pode ser tratados com preconceito em função dela. Lendo a Bíblia, é possível, por exemplo, obter o ensino teológico da valorização da vida, o que se choca com temas como o aborto e a eutanásia. Na narrativa da Criação, encontramos o surgimento do ser humano em dois gêneros definidos e complementares – macho e fêmea. Portanto, os evangélicos, por questão de formação e fé, são contra a legalização do aborto e a eutanásia, e não podem concordar com o comportamento gay. No entanto, essa opinião de fundamentação religiosa – e, portanto, definida e defendida no Artigo 5º da Constituição Federal – tem sido cerceada, combatida, silenciada. As correntes evangélicas, constantemente, são tratadas como "seitas" pela mídia. Etimologicamente, seita designa um grupo que é parcial, sectário, intolerante ao diferente. Observando o Brasil de hoje, quem está agindo como seita? A Igreja ou aqueles que tentam calá-la?
Todos têm o direito a dar, de modo lícito, a sua opinião. E cada um tem o direito de ouvir ou não ouvir o que o outro diz, e de aceitar ou não aceitar aquela opinião. Tudo exatamente como dizia o filósofo francês Voltaire, tanto tempo atrás: "Não concordo com uma só palavra do que dizeis; mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-la."
Lourenço Stelio Rega é pastor batista, mestre em Teologia e doutor em Ciências da Religião
Os jornais, telejornais e sites informativos tiveram um assunto dominante nos primeiros dias de maio. A prisão do pastor Marcos Pereira da Silva, líder da Assembleia de Deus dos Últimos Dias, foi um daqueles assuntos obrigatórios, repetidos à exaustão pela mídia. Controvertido por sua proximidade com criminosos e presidiários, Marcos foi preso sob acusação de haver estuprado algumas de suas fiéis e por desvio de recursos de seu ministério, que contava até com verba pública. Foi o suficiente para que o pastor fosse capa de jornal por vários dias seguidos e ocupasse blocos e mais blocos dos noticiários da TV. Claro, o fato em si é jornalístico e de interesse público, daí a quantidade de citações. Ainda que a culpa de Marcos não tivesse sido provada em Juízo, ele foi preso, como determina a lei, já que havia diversas acusações e o temor de que, solto, pudesse fugir ou prejudicar as investigações. Mas a superexposição do fato leva a uma dúvida: não fosse o suposto criminoso um pastor, o episódio teria tanto destaque?
Recentemente, outro fato nacionalmente comentado e noticiado envolveu um ministro evangélico. A chegada do pastor e deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal foi um daqueles cases dignos de estudo nas faculdades de jornalismo. Independentemente dos predicados pessoais de Feliciano – e, convenhamos, ele deu boa munição aos seus detratores de plantão, com um bocado de declarações e mensagens infelizes –, chamou a atenção a fúria com que a imprensa se abateu sobre ele. "Despreparado", "racista", "homofóbico", "primitivo" e "reacionário" foram apenas alguns dos adjetivos atribuídos ao parlamentar. A parcialidade de setores da grande imprensa chegou a assustar. Feliciano aparecia nas reportagens como alguém indigno do cargo que recebeu legitimamente dos seus pares, um sujeito que jamais deveria ter pisado no plenário do Congresso (para onde foi conduzido, é bom dizer, por mais de 200 mil eleitores).
A jornalista Suzana Singer, que exerce o papel de ombudsman da Folha de São Paulo, registrou o fato. Mencionando a falta do "outro lado" – no jargão jornalístico, a prática saudável de ouvir as duas partes na maior igualdade de condições possível –, ela escreveu: "É pouco perto das dezenas de textos negativos (reportagens, colunas e editorial) publicados desde que o caso estourou. A impressão que se tem, lendo jornais, revistas e navegando na internet, é que há unanimidade contra o deputado do PSC. Falta dar espaço às vozes dissonantes daqueles que criticam a cobertura da mídia e se recusam a entrar na corrente 'anti-Feliciano'."
Recentemente, outro fato nacionalmente comentado e noticiado envolveu um ministro evangélico. A chegada do pastor e deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal foi um daqueles cases dignos de estudo nas faculdades de jornalismo. Independentemente dos predicados pessoais de Feliciano – e, convenhamos, ele deu boa munição aos seus detratores de plantão, com um bocado de declarações e mensagens infelizes –, chamou a atenção a fúria com que a imprensa se abateu sobre ele. "Despreparado", "racista", "homofóbico", "primitivo" e "reacionário" foram apenas alguns dos adjetivos atribuídos ao parlamentar. A parcialidade de setores da grande imprensa chegou a assustar. Feliciano aparecia nas reportagens como alguém indigno do cargo que recebeu legitimamente dos seus pares, um sujeito que jamais deveria ter pisado no plenário do Congresso (para onde foi conduzido, é bom dizer, por mais de 200 mil eleitores).
A jornalista Suzana Singer, que exerce o papel de ombudsman da Folha de São Paulo, registrou o fato. Mencionando a falta do "outro lado" – no jargão jornalístico, a prática saudável de ouvir as duas partes na maior igualdade de condições possível –, ela escreveu: "É pouco perto das dezenas de textos negativos (reportagens, colunas e editorial) publicados desde que o caso estourou. A impressão que se tem, lendo jornais, revistas e navegando na internet, é que há unanimidade contra o deputado do PSC. Falta dar espaço às vozes dissonantes daqueles que criticam a cobertura da mídia e se recusam a entrar na corrente 'anti-Feliciano'."
LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA
Uma das características marcantes dessa pós-modernidade é a liberdade de consciência e de expressão. Tais prerrogativas estão ligadas à autonomia do indivíduo, um dos valores fundamentais em democracias. Se, no passado, a opinião de alguém era fruto de reflexão e dependência do ambiente em que vivia – como, por exemplo, da família ou da sociedade –, hoje, o indivíduo pode tomar decisões por conta própria, sem consultar ninguém. Cada um é dono de sua vida. Dizemos, assim, que o mundo tem ficado plano. Isto é, todos são iguais e ninguém é maior do que ninguém. Cada pessoa tem o direito de pensar o que bem entende, e expressar isso publicamente. O público se tornou privado, e o privado tem o direito de se tornar público. Direito é uma palavra de ordem do dicionário contemporâneo. Temos códigos de direitos para quase tudo na vida – direito do consumidor, direito da criança e do adolescente, direito do idoso etc. Pena que ainda não pensaram em fazer a contraparte, ou seja, a elaboração de códigos das responsabilidades de cada um.
Se tal realidade é uma das características principais da pós-modernidade, é bem verdade, também, que esta é uma era dos paradoxos. Se há liberdade por um lado, tem havido, também, repressão e intolerância quanto à manifestação de opiniões nem sempre coincidentes com a opinião geral, ou senso comum, como se queira. Neste território, podemos pensar na campanha generalizada da mídia e de segmentos da sociedade que também têm forte apelo e acesso aos meios de comunicação de massa, incluindo-se a internet, contra quase qualquer opinião que seja originária do meio religioso, especialmente do segmento evangélico.
Um exemplo clássico bem recente é a agressividade e preconceito expressos recentemente contra especialistas evangélicos (e, de fato, existem poucos) que têm manifestado sua opinião contrária, por exemplo, a duas bandeiras que têm sido levantadas, e bem alto, por grupos de interesse mais ou menos organizados: a flexibilização das leis que permitem o abortamento e a valorização da identidade homoafetiva de gênero. Aliás, o famoso projeto de lei 122/06, conhecido como lei anti-homofobia, em seu texto original, já representa afronta à liberdade de expressão e consciência, tão claramente insculpidas na Constituição Federal. O PL 122/06 já demonstrou ser uma verdadeira mordaça totalitária contra o direito de qualquer pessoa manifestar a sua opinião contrária ao comportamento gay. A ex-senadora e hoje ministra Marta Suplicy propôs uma aditiva ao texto em discussão, abrindo-se a possibilidade de manifestação em virtude de fé e crença – mas, e quanto a quem queira expressar sua divergência contra a homoafetividade por simples motivo de opinião pessoal?
É curioso esse tempo em que vivemos, quando todos têm direito de dizer o que pensam, mas não se vê com bons olhos aqueles que se manifestam contra este ou aquele posicionamento ou grupo. Se o discordante for evangélico, então, o patrulhamento é mais intenso. Em outras palavras, preconceituosamente, os evangélicos são rotulados como preconceituosos. É um paradoxo completo, um totalitarismo sem fim.
Uma das características marcantes dessa pós-modernidade é a liberdade de consciência e de expressão. Tais prerrogativas estão ligadas à autonomia do indivíduo, um dos valores fundamentais em democracias. Se, no passado, a opinião de alguém era fruto de reflexão e dependência do ambiente em que vivia – como, por exemplo, da família ou da sociedade –, hoje, o indivíduo pode tomar decisões por conta própria, sem consultar ninguém. Cada um é dono de sua vida. Dizemos, assim, que o mundo tem ficado plano. Isto é, todos são iguais e ninguém é maior do que ninguém. Cada pessoa tem o direito de pensar o que bem entende, e expressar isso publicamente. O público se tornou privado, e o privado tem o direito de se tornar público. Direito é uma palavra de ordem do dicionário contemporâneo. Temos códigos de direitos para quase tudo na vida – direito do consumidor, direito da criança e do adolescente, direito do idoso etc. Pena que ainda não pensaram em fazer a contraparte, ou seja, a elaboração de códigos das responsabilidades de cada um.
Se tal realidade é uma das características principais da pós-modernidade, é bem verdade, também, que esta é uma era dos paradoxos. Se há liberdade por um lado, tem havido, também, repressão e intolerância quanto à manifestação de opiniões nem sempre coincidentes com a opinião geral, ou senso comum, como se queira. Neste território, podemos pensar na campanha generalizada da mídia e de segmentos da sociedade que também têm forte apelo e acesso aos meios de comunicação de massa, incluindo-se a internet, contra quase qualquer opinião que seja originária do meio religioso, especialmente do segmento evangélico.
Um exemplo clássico bem recente é a agressividade e preconceito expressos recentemente contra especialistas evangélicos (e, de fato, existem poucos) que têm manifestado sua opinião contrária, por exemplo, a duas bandeiras que têm sido levantadas, e bem alto, por grupos de interesse mais ou menos organizados: a flexibilização das leis que permitem o abortamento e a valorização da identidade homoafetiva de gênero. Aliás, o famoso projeto de lei 122/06, conhecido como lei anti-homofobia, em seu texto original, já representa afronta à liberdade de expressão e consciência, tão claramente insculpidas na Constituição Federal. O PL 122/06 já demonstrou ser uma verdadeira mordaça totalitária contra o direito de qualquer pessoa manifestar a sua opinião contrária ao comportamento gay. A ex-senadora e hoje ministra Marta Suplicy propôs uma aditiva ao texto em discussão, abrindo-se a possibilidade de manifestação em virtude de fé e crença – mas, e quanto a quem queira expressar sua divergência contra a homoafetividade por simples motivo de opinião pessoal?
É curioso esse tempo em que vivemos, quando todos têm direito de dizer o que pensam, mas não se vê com bons olhos aqueles que se manifestam contra este ou aquele posicionamento ou grupo. Se o discordante for evangélico, então, o patrulhamento é mais intenso. Em outras palavras, preconceituosamente, os evangélicos são rotulados como preconceituosos. É um paradoxo completo, um totalitarismo sem fim.
"HEROÍNA GAY"
Atitudes como essas, que tomam a agenda de segmentos da sociedade e dos meios massivos de comunicação, se assemelham ao triste passado desse país, quando a discordância era tratada como crime. Já não é possível, em alguns círculos, que qualquer religioso – notadamente, evangélico –, movido por razões de crença e consciência, emita sua opinião livremente sem receber a pecha de preconceituoso. A discriminação embutida nessa "cruzada" contra a divergência é notória. Artigo de Leandro Colling publicado em 2011 na mesma Folha de São Paulo, intitulado Desnaturalização da heterossexualidade, procura defender a tese da coação cultural da heterossexualidade como se esse comportamento fosse resultado de uma imposição cultural. A argumentação deixa, por exemplo, de levar em conta os aspectos científicos elementares da constituição neurobiogenética e a funcionalidade diferencial que se tornam fatores fundantes e identitários da pessoa.
Ora, o homem tem uma constituição genética e neurológica diferente da mulher, e vice-versa. Então, a identidade de gênero como tem sido defendida acaba reduzida a um recurso artificial, utilizado para se tentar legitimar, pela dinâmica ou evolução cultural, a contradição entre identidade de gênero e sexo neurobiogenético. Enfim, o articulista tenta convencer que o heterossexual é um sujeito inferior, que não teve a oportunidade de optar por ser assim, mas foi submetido a uma imposição cultural irresistível. Eu perguntaria: E se amanhã a pedofilia for aceita culturalmente como uma espécie de "evolução cultural", teremos de aceitar esse crime como comportamento legítimo? Colling tem o direito de emitir a sua opinião, mas não de adjetivar os heterossexuais como seres inferiores, como intencionou no artigo. Ao mesmo tempo, a chamada grande imprensa faz questão de adjetivar positivamente os gays. Há coisa de dois meses, a cantora Daniela Mercury resolveu tornar pública sua relação homossexual com uma jornalista. Coincidência ou não, a notícia, transmitida em horário nobre pelos principais telejornais e publicada na capa dos jornais e de duas das maiores revistas semanais de informação, saiu no auge da "crise Feliciano". Contudo, os adjetivos dirigidos à artista foram bem diferentes: "Corajosa", "digna", "exemplo a ser seguido"... De uma hora para outra, Daniela, por sua homossexualidade, foi alçada à condição de heroína nacional.
Podemos achar horrível o que Marcos Pereira fez – se é que fez –, mas é no mínimo desonesto potencializar a acusação em face de sua função religiosa. Podemos, igualmente, discordar completamente de Marco Feliciano e até desejar sua saída da tal comissão que preside. Contudo, não tenho visto nos noticiários qualquer alusão á fé pessoal do senador Renan Calheiros, que assumiu a Presidência do Senado envolto em um mar de denúncias, e nem à religião dos deputados José Genoíno e João Paulo Cunha, que apesar de condenados pela Justiça no caso do mensalão, assumiram cargos na Comissão de Constituição e Justiça com base em brechas legais. A imprensa não cita a profissão de nenhuma personalidade sob suspeita. Fosse Feliciano um padre e Pereira, um pai de santo, como seriam tratados?
Há evangélicos e pastores que cometem crimes ou se metem em atos de corrupção? Sem dúvida, da mesma maneira que há padres pedófilos, bispos desonestos e parlamentares corruptos. Entretanto, a culpa de um indivíduo não pode ser atribuída, pro extensão, ao segmento que integra. Além disso, diferentemente da Igreja Católica, que tem um papa, as denominações evangélicas são descentralizadas, não seguem um líder único. Portanto, ao se fazer esta mistura conceitual do que é ser evangélico, ignora-se a imensa maioria de crentes honestos e corretos.
E a mídia tem grande participação nesse processo de convencimento social, na medida em que faz germinar o estereótipo do evangélico como alguém extremado, esquizofrênico, mentalmente desajustado. Vivemos hoje um tipo de inquisição que tem como objetivo relegar o título "evangélico" a um sinônimo de obsolescência, de gente retrógada. Isso é notório quando se percebe, com as exceções de praxe, coberturas completamente equivocadas sobre o segmento, que indicam desconhecimento da dinâmica e da história da Igreja Evangélica brasileira e de seu povo – sem contar a omissão deliberada de fatos concretos que demonstram a seriedade das denominações protestantes e sua magnífica contribuição que já prestaram e ainda prestam nas áreas social, educacional e de saúde, entre muitas outras. Raríssimas vezes, tal legado é exibido, a não ser como nota de rodapé em uma página de jornal ou programa de TV. Isso, sem se falar nos personagens caricatos, ridículos mesmo, que representam os evangélicos nas telenovelas.
Atitudes como essas, que tomam a agenda de segmentos da sociedade e dos meios massivos de comunicação, se assemelham ao triste passado desse país, quando a discordância era tratada como crime. Já não é possível, em alguns círculos, que qualquer religioso – notadamente, evangélico –, movido por razões de crença e consciência, emita sua opinião livremente sem receber a pecha de preconceituoso. A discriminação embutida nessa "cruzada" contra a divergência é notória. Artigo de Leandro Colling publicado em 2011 na mesma Folha de São Paulo, intitulado Desnaturalização da heterossexualidade, procura defender a tese da coação cultural da heterossexualidade como se esse comportamento fosse resultado de uma imposição cultural. A argumentação deixa, por exemplo, de levar em conta os aspectos científicos elementares da constituição neurobiogenética e a funcionalidade diferencial que se tornam fatores fundantes e identitários da pessoa.
Ora, o homem tem uma constituição genética e neurológica diferente da mulher, e vice-versa. Então, a identidade de gênero como tem sido defendida acaba reduzida a um recurso artificial, utilizado para se tentar legitimar, pela dinâmica ou evolução cultural, a contradição entre identidade de gênero e sexo neurobiogenético. Enfim, o articulista tenta convencer que o heterossexual é um sujeito inferior, que não teve a oportunidade de optar por ser assim, mas foi submetido a uma imposição cultural irresistível. Eu perguntaria: E se amanhã a pedofilia for aceita culturalmente como uma espécie de "evolução cultural", teremos de aceitar esse crime como comportamento legítimo? Colling tem o direito de emitir a sua opinião, mas não de adjetivar os heterossexuais como seres inferiores, como intencionou no artigo. Ao mesmo tempo, a chamada grande imprensa faz questão de adjetivar positivamente os gays. Há coisa de dois meses, a cantora Daniela Mercury resolveu tornar pública sua relação homossexual com uma jornalista. Coincidência ou não, a notícia, transmitida em horário nobre pelos principais telejornais e publicada na capa dos jornais e de duas das maiores revistas semanais de informação, saiu no auge da "crise Feliciano". Contudo, os adjetivos dirigidos à artista foram bem diferentes: "Corajosa", "digna", "exemplo a ser seguido"... De uma hora para outra, Daniela, por sua homossexualidade, foi alçada à condição de heroína nacional.
Podemos achar horrível o que Marcos Pereira fez – se é que fez –, mas é no mínimo desonesto potencializar a acusação em face de sua função religiosa. Podemos, igualmente, discordar completamente de Marco Feliciano e até desejar sua saída da tal comissão que preside. Contudo, não tenho visto nos noticiários qualquer alusão á fé pessoal do senador Renan Calheiros, que assumiu a Presidência do Senado envolto em um mar de denúncias, e nem à religião dos deputados José Genoíno e João Paulo Cunha, que apesar de condenados pela Justiça no caso do mensalão, assumiram cargos na Comissão de Constituição e Justiça com base em brechas legais. A imprensa não cita a profissão de nenhuma personalidade sob suspeita. Fosse Feliciano um padre e Pereira, um pai de santo, como seriam tratados?
Há evangélicos e pastores que cometem crimes ou se metem em atos de corrupção? Sem dúvida, da mesma maneira que há padres pedófilos, bispos desonestos e parlamentares corruptos. Entretanto, a culpa de um indivíduo não pode ser atribuída, pro extensão, ao segmento que integra. Além disso, diferentemente da Igreja Católica, que tem um papa, as denominações evangélicas são descentralizadas, não seguem um líder único. Portanto, ao se fazer esta mistura conceitual do que é ser evangélico, ignora-se a imensa maioria de crentes honestos e corretos.
E a mídia tem grande participação nesse processo de convencimento social, na medida em que faz germinar o estereótipo do evangélico como alguém extremado, esquizofrênico, mentalmente desajustado. Vivemos hoje um tipo de inquisição que tem como objetivo relegar o título "evangélico" a um sinônimo de obsolescência, de gente retrógada. Isso é notório quando se percebe, com as exceções de praxe, coberturas completamente equivocadas sobre o segmento, que indicam desconhecimento da dinâmica e da história da Igreja Evangélica brasileira e de seu povo – sem contar a omissão deliberada de fatos concretos que demonstram a seriedade das denominações protestantes e sua magnífica contribuição que já prestaram e ainda prestam nas áreas social, educacional e de saúde, entre muitas outras. Raríssimas vezes, tal legado é exibido, a não ser como nota de rodapé em uma página de jornal ou programa de TV. Isso, sem se falar nos personagens caricatos, ridículos mesmo, que representam os evangélicos nas telenovelas.
QUEM É SEITA?
O que é possível concluir é que está havendo uma campanha, muitas vezes imperceptível ao olhar menos atento, para prejudicar a imagem do evangélico e do protestante, ao estilo de uma refinada estratégia terrorista. Aliás, uma das estratégias terroristas para sabotar qualquer agrupamento segue três passos bem definidos – infiltrar, corromper e, depois, desmoralizar. O que temos hoje não é direito, mas delito de opinião, ao não se respeitar conceitos diferentes. O protestantismo histórico, desde a sua origem – basta ver o conceito de sacerdócio universal –, defendeu o liberalismo, o indivíduo. Não somos intolerantes; intolerantes são os que nos criticam por termos opiniões definidas.
Aliás, é necessário diferenciar preconceito de conceito ou convicção. Todos têm o direito a ter sua opinião (conceito, convicção) e ninguém pode ser tratados com preconceito em função dela. Lendo a Bíblia, é possível, por exemplo, obter o ensino teológico da valorização da vida, o que se choca com temas como o aborto e a eutanásia. Na narrativa da Criação, encontramos o surgimento do ser humano em dois gêneros definidos e complementares – macho e fêmea. Portanto, os evangélicos, por questão de formação e fé, são contra a legalização do aborto e a eutanásia, e não podem concordar com o comportamento gay. No entanto, essa opinião de fundamentação religiosa – e, portanto, definida e defendida no Artigo 5º da Constituição Federal – tem sido cerceada, combatida, silenciada. As correntes evangélicas, constantemente, são tratadas como "seitas" pela mídia. Etimologicamente, seita designa um grupo que é parcial, sectário, intolerante ao diferente. Observando o Brasil de hoje, quem está agindo como seita? A Igreja ou aqueles que tentam calá-la?
Todos têm o direito a dar, de modo lícito, a sua opinião. E cada um tem o direito de ouvir ou não ouvir o que o outro diz, e de aceitar ou não aceitar aquela opinião. Tudo exatamente como dizia o filósofo francês Voltaire, tanto tempo atrás: "Não concordo com uma só palavra do que dizeis; mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-la."
O que é possível concluir é que está havendo uma campanha, muitas vezes imperceptível ao olhar menos atento, para prejudicar a imagem do evangélico e do protestante, ao estilo de uma refinada estratégia terrorista. Aliás, uma das estratégias terroristas para sabotar qualquer agrupamento segue três passos bem definidos – infiltrar, corromper e, depois, desmoralizar. O que temos hoje não é direito, mas delito de opinião, ao não se respeitar conceitos diferentes. O protestantismo histórico, desde a sua origem – basta ver o conceito de sacerdócio universal –, defendeu o liberalismo, o indivíduo. Não somos intolerantes; intolerantes são os que nos criticam por termos opiniões definidas.
Aliás, é necessário diferenciar preconceito de conceito ou convicção. Todos têm o direito a ter sua opinião (conceito, convicção) e ninguém pode ser tratados com preconceito em função dela. Lendo a Bíblia, é possível, por exemplo, obter o ensino teológico da valorização da vida, o que se choca com temas como o aborto e a eutanásia. Na narrativa da Criação, encontramos o surgimento do ser humano em dois gêneros definidos e complementares – macho e fêmea. Portanto, os evangélicos, por questão de formação e fé, são contra a legalização do aborto e a eutanásia, e não podem concordar com o comportamento gay. No entanto, essa opinião de fundamentação religiosa – e, portanto, definida e defendida no Artigo 5º da Constituição Federal – tem sido cerceada, combatida, silenciada. As correntes evangélicas, constantemente, são tratadas como "seitas" pela mídia. Etimologicamente, seita designa um grupo que é parcial, sectário, intolerante ao diferente. Observando o Brasil de hoje, quem está agindo como seita? A Igreja ou aqueles que tentam calá-la?
Todos têm o direito a dar, de modo lícito, a sua opinião. E cada um tem o direito de ouvir ou não ouvir o que o outro diz, e de aceitar ou não aceitar aquela opinião. Tudo exatamente como dizia o filósofo francês Voltaire, tanto tempo atrás: "Não concordo com uma só palavra do que dizeis; mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-la."
Lourenço Stelio Rega é pastor batista, mestre em Teologia e doutor em Ciências da Religião
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